1. O Autor-Contador de Histórias (de seu tempo, de sua terra)
Recebido com aplausos demorados, o escritor moçambicano senta-se ao lado do brasileiro Antônio Torres para dialogar sobre a escrita vinculada ao tema “terra”. O evento é a V Festa Literária de Parati (2007), para a qual Mia Couto foi convidado, parte de uma seqüência de acontecimentos que levariam-no a falar sobre a própria obra e sua repercussão, em diferentes cidades e instituições brasileiras – antes na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sobre sua experiência como leitor de Guimarães Rosa; depois no Centro Cultural de Parati, sobre sua ligação com a editora Língua Geral, do angolano José Eduardo Agualusa; na semana seguinte, no Congresso de Leitura, na Unicamp; nos intervalos, concedendo entrevistas a jornais, revistas, emissoras de tevê de sinal aberto e a cabo. Esta se tornou a rotina de Antonio Emílio Leite Couto, tido como “uma das vozes mais originais da literatura de expressão portuguesa contemporânea”, no dizer da professora Marilene Felinto[i], um dos “mais prestigiados escritores” africanos[ii], segundo as especialistas Rita Chaves e Tânia Macedo (ambas da Universidade de São Paulo), sócio correspondente da Academia Brasileira de Letras – ocupa a cadeira de número cinco. Em cada oportunidade, repete-se a mesma ocorrência: às perguntas conceituais sobre sua obra de literatura e seu papel afirmativo da identidade moçambicana, ou quiçá sobre sua representatividade para o fazer literário africano, Mia Couto responde, em numerosas situações: “Deixem-me contar uma história sobre isto” – à qual se segue o relato e a conclusão com referência direta ao enunciado da pergunta. A recorrência desse “modo de lidar com os públicos” (acadêmicos, midiáticos ou formados simplesmente por seus leitores e fãs) tem correspondência direta com a gênese literária do autor, tanto quanto com sua experiência como leitor. Trata-se do desejo intenso de tornar tudo ao redor uma narrativa, uma história contada.
A análise dos discursos de Mia Couto supõe a convergência entre estes depoimentos em ocasiões públicas e as próprias obras do moçambicano, todas elas marcadas por uma oralidade muito singular. Os enredos dos romances são construídos em torno da idéia de que há várias histórias a serem contadas (e trançadas) para se atingir os objetivos de cada criação. Isto pode ser observado quando da consideração particular sobre cada estrutura textual de sua produção romanesca. Cada uma poderia subsistir […]
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[i] In: “Folha de S. Paulo”, Caderno Mundo, 21/07/2002. Também in: http://www.macua.org/miacouto/MiaCoutoexerciciodahumildade.htm, acessado em 17/07/2007.
[ii] Da matéria “Caminhos da Ficção da África Portuguesa”, na revista Biblioteca EntreLivros, edição especial, no 6.
Fonte: Artigo publicado na Revista COMUM, publicação das Faculdades Integradas Hélio Alonso, Julho/Dezembro 2008, v.14 – no. 31, ISSN 0101-305X
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